Vida Integrada

As Cartas de Maria

Ela cuida de tudo e de todos o dia inteiro e não consegue cuidar de si mesma como gostaria.

Maria tinha apenas 9 anos quando saiu de casa para trabalhar. Mas esta não foi uma escolha dela. Afinal, como ela poderia escolher abandonar seus amigos e as gostosas tardes de brincadeiras para cuidar de outra criança, uma que ela nem sequer conhecia.

Ela estava apavorada, longe de sua casa, numa cidade completamente estranha, com pessoas estranhas, e aquele bebê chorão que agora ela era obrigada a cuidar. Tarefa difícil porque não era uma de suas bonecas, era um bebê de verdade que aquela mulher esquisita estava colocando no seu colo. E o bebê chorava muito.

Maria pegou a mamadeira da mão daquela mulher e pensou: “Não pode ser tão difícil, já fiz isso muitas vezes com as minhas bonecas.”

Lentamente ela foi aproximando a mamadeira e, num passe de mágica o bebê parou de chorar. O alívio que Maria sentiu com o silêncio foi tão grande que daquele momento em diante, todas as vezes que aquele bebê chorava ela dava a ele algo para comer ou beber. Bem, até o dia em que aquela cruel mulher descobriu sua estratégia e se botou aos gritos com a frágil Maria.

Naquela tarde cinza todos os sonhos de Maria foram sufocados pelos gritos histéricos daquela mulher.

A frágil menina chorou baixinho, até o final do dia. Se ela pudesse prestar atenção nas palavras gritadas pela mulher à sua frente saberia que não passava de uma mãe protegendo seu filho de um perigo invisível, mas Maria não conseguiu ouvir uma única palavra porque, ela ainda não sabia naquela época, mas o que a feriu tão gravemente foi o tom daquela voz, a gritaria, os barulhos muito altos e a agressividade dos sons até hoje atingem diretamente o coração de Maria e, quando isto acontece, ela se encolhe como um animal ferido. Maria é uma daquelas pessoas que se comunica pela linguagem do coração. Ela aprendeu a usar as palavras, assim como todas as outras pessoas à sua volta, mas nunca perdeu a habilidade de falar e ouvir com o coração. E a linguagem do coração é sutil e profunda ao mesmo tempo e jamais gritada ou violenta.

Aquela gritaria não foi a primeira na vida da menina, mas daquele dia em diante ela faria tudo o que fosse preciso para evitar que alguém gritasse com ela outra vez.

Depois de seis décadas ela ainda podia sentir o grande estrago que aqueles gritos fizeram na sua vida.

Por mais que tentasse ela não conseguiu se livrar dos gritos de pessoas histéricas com as quais teve que conviver ao longo de sua vida. Até mesmo a música alta fere o seu coração. Se ela pudesse viveria num lugar isolado onde os sons não pudessem chegar. Mas ela já estava se sentindo velha demais para recomeçar e achava impossível mudar os rumos que sua vida tomou.

Quando tinha apenas seis anos de idade Maria aprendeu a ler e escrever e se apaixonou pela literatura. Durante toda sua fase escolar ela sempre tirava nota 10 em redação e notas muito abaixo da média em matemática, história e geografia. Curiosamente ela nunca se importou com suas notas baixas e estudava estas matérias apenas o suficiente para passar de ano. Mas no dia em que ela recebeu uma nota 9 em redação ficou tão arrasada que parecia estar no meio de uma grande tragédia. Ela chorou muito e foi chorando apelar para sua professora corrigir sua redação novamente, ela não se conformava com aquela nota. Infelizmente ela não conseguiu a revisão da nota e teve que conviver para o resto de sua vida com aquela frustração, que para ela parecia o fim do mundo.

Depois da péssima experiência com a gritaria daquela mulher, Maria desenvolveu um curioso hábito, ela passou a escrever umas cartas muito secretas, que ela escrevia escondida e guardava em lugares tão bem protegidos que até mesmo ela tinha dificuldade para encontrar algumas vezes.

As cartas de Maria estavam na verdade espalhadas pelos cadernos, nas páginas em branco de seus livros e, mais tarde, em quase todas as páginas de suas agendas ela escrevia suas cartas.

Sim, você já compreendeu, ela acreditava que suas cartas estavam muito bem guardadas e escondidas dos olhares curiosos, mas escrever era parte da sua natureza e ela não conseguia esconder, por mais que tentasse.

Seus segredos estavam protegidos apenas pelo poder da invisibilidade que Maria graciosamente assumiu para si mesma desde sua infância. Ela escolheu se tornar invisível aos olhos dos outros para preservar sua Essência e acreditava que assim poderia ser feliz.

A invisibilidade a protegeu por algumas décadas mas há muito tempo já havia se tornado um fardo pesado demais para carregar e sua alma ansiava por se expressar. Dentro dela uma LUZ pequena e frágil ainda teimava em se manter acesa e agora estava aumentando, brilhando mais e mais dentro dela.

Alguma coisa estava acontecendo por dentro.

Ela olhava pela janela e o mundo ainda era o mesmo, as pessoas pareciam as mesmas, a paisagem não mudou muito nos últimos anos, então o que estaria acontecendo? Ela não sabia a resposta mas tinha certeza de uma coisa, algo estava mudando dentro dela, sua alma estava sedenta de algo que ela ainda não sabia o que era.

Já fazia alguns anos que Maria tinha parado de escrever com o coração.

Ela agora só escrevia comercialmente, em troca de um salário que recebia no final de cada mês e a vida estava assim, meio cinza todos os dias.

Olhando pela janela ela percebeu que o poder da invisibilidade não era mais útil em sua vida e, mesmo sem saber por onde começar ela decidiu mudar os rumos da sua vida.

Permaneceu colada ao vidro da janela por mais alguns segundos e, num movimento cheio de energia ela se virou e saiu correndo em busca de algo onde pudesse escrever. Pegou seu notebook, abriu um documento de texto e começou a digitar. Não tinha a menor ideia sobre o que escrever mas escreveu mesmo assim. Começou o texto com palavras soltas, ideias sem sentindo, frases que pareciam incompletas e sem nenhuma preocupação com a gramática. Apenas escreveu por horas e horas, com o coração, sem ler, sem revisar, sem se preocupar, só escreveu.

Depois de algumas horas, que Maria nem sabe quantas foram, ela fechou o notebook e deu por encerrada a tarefa de escrever.

Ela estava cansada mas muito feliz. Sua alma estava leve como nunca se sentiu antes. Ela não podia ver mas uma LUZ DOURADA muito intensa estava agora brilhando em torno dela. Maria LIBERTOU SUA ESSÊNCIA DE LUZ e ali ela começou a ESCREVER sua Nova História.

Muito tempo depois alguém encontrou as Cartas de Maria e começou a guardar com carinho cada carta que encontrava com o objetivo de reunir todas as cartas de Maria para publicar um livro honrando aquela bela história de vida.

E naquela carta, onde Maria Libertou Sua Essência, lá estava escrito no último parágrafo: “Sou uma Mulher da Nova Era. Entendo hoje que sempre estive à frente do meu tempo. Levei mais de seis décadas para compreender que minha natureza é sutil e forte ao mesmo tempo. E neste momento, enquanto escrevo estas palavras, minha alma deseja mostrar ao mundo a LUZ que sinto dentro de mim. Por isso eu agora dou permissão para minha LUZ BRILHAR à minha volta porque sei que a Luz cresce à medida que acende outras em seu caminho.”

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